Estado de coisas inconstitucional

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Conceito

Estado de coisas inconstitucional é a situação na qual estão presentes violações generalizadas, contínuas e sistemáticas de direitos fundamentais, por vários órgãos estatais, demandando soluções estruturais igualmente amplas, para a solução dos problemas e supressão das omissões estatais.

Para a caracterização deste estado, é necessária a presença dos seguintes requisitos:

  • Grave, permanente e generalizada violação de direitos fundamentais, afetando um amplo e indeterminado número de pessoas.
  • Comprovada omissão reiterada de órgãos estatais diversos, no cumprimento de seus deveres institucionais para a tutela dos direitos fundamentais (por exemplo, falta de medidas legislativas, administrativas e políticas).
  • Insuficiência de uma solução unilateral, voltada para um único órgão (é necessária a construção de uma solução múltipla, plurilateral, dirigindo-se a uma pluralidade de órgãos e autoridades).

Assim, se os poderes públicos, de forma sistêmica, reiterada e generalizada, praticam atos e/ou omissões que violam os direitos fundamentais, está-se diante de um estado de coisas inconstitucional, ensejando uma série de medidas igualmente generalizadas, plurais, envolvendo vários agentes e órgãos públicos, a fim de diminuir a violação aos direitos fundamentais sistematicamente violados.

ADPF 347/DF

No Brasil, a ADPF 347/DF, que pedia providências para a crise prisional, reconhecendo a violação de direitos fundamentais da população carcerária, é um exemplo de aplicação deste conceito.

Segundo o PSOL, autor da arguição, em nenhum outro campo a distância entre “as promessas generosas da Constituição e a realidade é maior, é mais abissal”, do que no que se refere ao sistema prisional. “Não há, talvez, desde a abolição da escravidão, maior violação de direitos humanos no solo nacional”, afirmou. “Trata-se da mais grave afronta à Constituição que tem lugar atualmente no país”.

Diante disso, segundo o relator, no sistema prisional brasileiro ocorre violação generalizada de direitos fundamentais dos presos no tocante à dignidade. “O quadro é geral, devendo ser reconhecida a inequívoca falência do sistema”, afirmou.

Para o ministro Marco Aurélio, o afastamento do estado de inconstitucionalidade pretendido na ação só é possível diante da mudança significativa do Poder Público. “A responsabilidade pelo estágio ao qual chegamos não pode ser atribuída a um único e exclusivo Poder, mas aos três – Legislativo, Executivo e Judiciário –, e não só os da União, como também os dos estados e do Distrito Federal”, afirmou. Há, segundo ele, problemas tanto de formulação e implementação de políticas públicas quanto de interpretação e aplicação da lei penal. “Falta coordenação institucional”.

Jurisprudência

Além do caso mencionado, temos diversos exemplos de aplicação do conceito pelos tribunais.

Vejamos:

Habeas Corpus

ESTADO DE COISAS INCONSTITUCIONAL. CULTURA DO ENCARCERAMENTO. NECESSIDADE DE SUPERAÇÃO. DETENÇÕES CAUTELARES DECRETADAS DE FORMA ABUSIVA E IRRAZOÁVEL. INCAPACIDADE DO ESTADO DE ASSEGURAR DIREITOS FUNDAMENTAIS ÀS ENCARCERADAS. OBJETIVOS DE DESENVOLVIMENTO DO MILÊNIO E DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DA ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. REGRAS DE BANGKOK. ESTATUTO DA PRIMEIRA INFÂNCIA. APLICAÇÃO À ESPÉCIE. ORDEM CONCEDIDA. EXTENSÃO DE OFÍCIO. V -Tramitação de mais de 100 milhões de processos no Poder Judiciário, a cargo de pouco mais de 16 mil juízes, a qual exige que o STF prestigie remédios processuais de natureza coletiva para emprestar a máxima eficácia ao mandamento constitucional da razoável duração do processo e ao princípio universal da efetividade da prestação jurisdicional VI – A legitimidade ativa do habeas corpus coletivo, a princípio, deve ser reservada àqueles listados no art. 12 da Lei 13.300 /2016, por analogia ao que dispõe a legislação referente ao mandado de injunção coletivo. VII Comprovação nos autos de existência de situação estrutural em que mulheres grávidas e mães de crianças (entendido o vocábulo aqui em seu sentido legal, como a pessoa de até doze anos de idade incompletos, nos termos do art. 2° do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA) estão, de fato, cumprindo prisão preventiva em situação degradante, privadas de cuidados médicos pré-natais e pós-parto, inexistindo, outrossim berçários e creches para seus filhos. VIII – Cultura do encarceramento que se evidencia pela exagerada e irrazoável imposição de prisões provisórias a mulheres pobres e vulneráveis, em decorrência de excessos na interpretação e aplicação da lei penal, bem assim da processual penal, mesmo diante da existência de outras soluções, de caráter humanitário, abrigadas no ordenamento jurídico vigente. HC 0004590-38.2017.1.00.0000 SP

Mandado de Segurança

ESTADO DE COISAS INCONSTITUCIONAL. VIOLAÇÃO DE UMA GARANTIA CONSTITUCIONAL E CONVENCIONAL. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. CONCESSÃO PARCIAL DA SEGURANÇA. RESTRIÇÃO E LIMITES DO DIREITO FUNDAMENTAL. Direito líquido e certo dos advogados em ter acesso aos seus clientes custodiados. I. A comunicabilidade do preso com seu advogado é uma garantia fundamental prevista na Constituição Federal; na Convenção Americana de Direitos Humanos; e no Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados, entre outros diplomas legais. Dessa forma, é impositiva a concessão da segurança para assegurar aos advogados o acesso livre e pleno aos seus clientes custodiados no Centro de Triagem localizado nesta Capital. Demonstrado o direito líquido e certo. II. O estado de coisas inconstitucional presente no sistema prisional brasileiro, com a violação sistemática de direitos de presos, impõe ao Judiciário o papel de assegurar a preservação das garantias constitucionais básicas, como é a da comunicabilidade dos presos. A solicitação de restrição à garantia constitucional pela imposição de dias e horários preestabelecidos não apresentou a devida justificativa para tanto, havendo possibilidade fática e jurídica para que essa garantia seja cumprida sem restrições. lll. Os direitos fundamentais não são absolutos, no sentido de serem ilimitados. Nesses termos, impositivo estabelecer horário para que, considerando o atual estado do sistema carcerário, seja garantida a comunicabilidade dos presos com os advogados, sem desprestígio da segurança pública e da segurança dos profissionais que se encontram custodiando os presos, assim como dos próprios advogados. Horário estabelecido para a visitação entre 9h e 11 h3Omin, com intervalo para o almoço dos presos, e reinício às 13h3Omin com término às 17h, diariamente, inclusive nos finais de semana e feriados. SEGURANÇA PARCIALMENTE CONCEDIDA. MS 0273222-46.2019.8.21.7000 RS

MAPA MENTAL – RESUMO

Estado de coisas inconstitucional - Mapa mental

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BIBLIOGRAFIA

NUNES JÚNIOR, Flávio Martins Alves. Curso de direito constitucional. 3. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019.


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