Art. 927 do CC [COMENTADO]

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Transcrição – Art. 927 do CC

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

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Art 927 do CC - Comentado

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Os comentários que se seguem foram feitos por Silvio de Salvo Venosa:

Introdução

O termo responsabilidade é utilizado em qualquer situação na qual alguma pessoa, natural ou jurídica, deva arcar com as consequências de um ato, fato ou negócio danoso. Sob essa noção, toda atividade humana, portanto, pode acarretar o dever de indenizar. Desse modo, o estudo da responsabilidade civil abrange todo o conjunto de princípios e normas que regem a obrigação de indenizar.

Responsabilidade com culpa

A responsabilidade civil extracontratual ou extranegocial é fonte de obrigações. Reside no ato ilícito seu centro gravitador. Este Código manteve a culpa em sua conceituação feita no art. 186.

O Código Civil, embora mantendo a mesma estrutura do diploma anterior, trata da responsabilidade civil com mais profundidade, embora sem a amplitude que seria desejável, no art. 927 ss.

A definição de ato ilícito é fornecida pelo art. 186:

“Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”

Vê-se, portanto, que foi acrescentada a possibilidade de indenização pelo dano exclusivamente moral, como fora apontado pela Constituição de 1988, algo de há muito reclamado pela sociedade e pela doutrina e sistematicamente repelido até então pelos tribunais.

O art. 187 do estatuto civil define expressamente o abuso de direito, norma ausente de forma expressa no sistema anterior, equiparando-o à responsabilidade civil, para fins práticos.

Responsabilidade sem culpa

Ao analisarmos especificamente a culpa, lembramos a tendência jurisprudencial cada vez mais marcante de alargar seu conceito, ou de dispensá-lo como requisito para o dever de indenizar. Surge, destarte, a noção de culpa presumida, sob o prisma do dever genérico de não prejudicar. Esse fundamento fez surgir a teoria da responsabilidade objetiva, presente na lei em várias oportunidades, que desconsidera a culpabilidade, ainda que não se confunda a culpa presumida com a responsabilidade objetiva. A insuficiência da fundamentação da teoria da culpabilidade levou à criação da teoria do risco, com vários matizes, que sustenta ser o sujeito responsável por riscos ou perigos que sua atuação promove, ainda que coloque toda diligência para evitar o dano.

Em síntese, cuida-se da responsabilidade sem culpa em inúmeras situações nas quais sua comprovação inviabilizaria a indenização para a parte presumivelmente mais vulnerável.

Nesse aspecto, há importante inovação neste Código, presente no parágrafo único do art. 927. Por esse dispositivo, a responsabilidade objetiva aplica-se, além dos casos descritos em lei, também “quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.

Reitera-se, contudo, que o princípio gravitador da responsabilidade extracontratual no Código Civil ainda é o da responsabilidade subjetiva, ou seja, responsabilidade com culpa, pois esta também é a regra geral traduzida neste Código, no caput do art. 927.

Não nos parece, como apregoam alguns, que este estatuto fará desaparecer a responsabilidade com culpa em nosso sistema. A responsabilidade objetiva, ou responsabilidade sem culpa, somente pode ser aplicada quando existe lei expressa que a autorize ou no julgamento do caso concreto, na forma facultada pelo parágrafo único do art. 927.

Portanto, na ausência de lei expressa, a responsabilidade pelo ato ilícito será subjetiva, pois esta é ainda a regra geral no direito brasileiro. Em casos excepcionais, levando em conta os aspectos da nova lei, o juiz poderá concluir pela responsabilidade objetiva no caso que examina.

Jurisprudências relacionadas

Caso 1

INDENIZAÇÃO – DANO MATERIAL – CURTO-CIRCUITO NA REDE ELÉTRICA – DANOS NOS EQUIPAMENTOS DA EMPRESA – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA – MÁ PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – ART. 14, CDC C/C PARÁGRAFO ÚNICO, ART. 927, CÓDIGO CIVIL – PROVA DO PREJUÍZO – NEXO DE CAUSALIDADE – DEVER DE REPARAR – LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ – INOCORRÉNCIA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Na forma do art. 14 do CDC c/c art. 927 do Código Civil, e em razão da atividade desenvolvida, o fornecimento de energia elétrica por concessionária de serviço público, havendo a má prestação do serviço, tem a responsabilidade objetiva, e o dano causado a outrem por conta da interrupção, configurado o nexo de causalidade, revela-se passível de reparação o dano material decorrente. Conforme os precedentes do Superior Tribunal de Justiça, o reconhecimento da litigância de má-fé depende da demonstração de dano processual, fato que não restou evidenciado nos autos.

(TJ-MT – APL: 00102247420158110006 MT, Relator: CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Data de Julgamento: 29/11/2017, TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Data de Publicação: 06/12/2017)

Caso 2

INDENIZAÇÃO — INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA NÃO DEMOSTRADO — EMPRÉSTIMO MEDIANTE CARTÃO MAGNÉTICO E SENHA PESSOAL — COBRANÇA – EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO — INEXISTÊNCIA DE ATO ILÍCITO — ART. 927, CC — RECURSO DESPROVIDO. De acordo com o art. 927, do C. Civil, o ato ilícito deve restar devidamente comprovado. A norma civil ao estipular a responsabilidade indenizatória vinculou-a de modo inseparável ao ato ilícito, de modo que a falta deste, inexiste o dever de indenizar.

(TJ-MT – APL: 00052274020158110041 MT, Relator: CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Data de Julgamento: 21/03/2018, TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Data de Publicação: 26/03/2018)

Caso 3

INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL — CHEQUE SUSTADO — PROTESTO DO TÍTULO — INEXIGIBILIDADE DA CÁRTULA DISCUTIDA EM AÇÃO CONEXA E JULGADA IMPROCEDENTE — DÍVIDA EXISTENTE — EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO — INEXISTÊNCIA DE ATO ILÍCITO — ART. 927, CC — HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS — ART. 85, § 11, DO CPC — RECURSO DESPROVIDO. In casu, com o julgamento improcedente da ação quanti minoris em apenso, não prospera a alegação de inexigibilidade do título, notadamente pela ausência do direito ao abatimento invocado naqueles autos, de modo que o protesto do cheque constitui, na verdade, o exercício regular de um direito. De acordo com o art. 927, do C. Civil, o ato ilícito deve restar devidamente comprovado. A norma civil ao estipular a responsabilidade indenizatória vinculou-a de modo inseparável ao ato ilícito, de modo que a falta deste, inexiste o dever de indenizar. Em razão do trabalho adicional empregado pelo advogado, da natureza e da importância da causa, majoram-se os honorários advocatícios, nos moldes do art. 85, § 11, do CPC.

(TJ-MT – APL: 00032589720128110007 MT, Relator: CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Data de Julgamento: 29/08/2018, TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Data de Publicação: 03/09/2018)

REFERÊNCIA

VENOSA, Sílvio de Salvo; RODRIGUES, Cláudia. Código Civil interpretado. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2019.


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