Princípios do Direito Penal

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Os princípios do Direito Penal são um norte interpretativo das normas penais e decorrem do nosso atual modelo constitucional, que sustenta o Estado Democrático de Direito.

Esse conteúdo foi reformulado em 2023.

ÍNDICE

RESERVA LEGAL OU ESTRITA LEGALIDADE

Previsão

O art. 5º, XXXIX, da CRFB/88 dispõe:

Não há crime sem LEI anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação LEGAL.

No mesmo sentido, o art. 1º do Código Penal preceitua:

Não há crime sem LEI anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação LEGAL.

Apesar de os dispositivos citarem apenas o crime, o princípio também é aplicável às contravenções penais.

IMPORTANTE
O princípio da reserva legal é cláusula pétrea, estando inserido no rol de direitos e garantias fundamentais.

Conteúdo

O princípio da reserva legal determina o MONOPÓLIO DA LEI (em sentido formal, estrito) para a criação de crimes (e contravenções) e para a cominação das respectivas penas.

Desdobramentos

O princípio da reserva legal possui os seguintes desdobramentos:

LEX PRAEVIA
(LEI PRÉVIA)
IRRETROATIVIDADE → As leis penais incriminadoras NÃO retroagem, devendo ser anteriores aos fatos que pretendem punir (= anterioridade da lei penal).
RETROATIVIDADE → As normas de caráter benéfico têm aplicação plena (retroagem para beneficiar o agente). Vale mencionar que a data de referência para a incidência da norma é a da atividade (art. 4º do CP), SALVO nos crimes permanentes e continuados ↴
SÚMULA 711 DO STF → A lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à cessação da continuidade ou da permanência.
LEX SCRIPTA
(LEI ESCRITA)
Somente a lei escrita é que pode criar crimes e cominar penas. Nesse sentido, proíbe-se o costume incriminador.
LEX STRICTA
(LEI ESTRITA)
Proíbe a analogia in malam partem (que agrava a situação do agente).
LEX CERTA
(LEI CERTA)
Proíbe penas ou tipos penais indeterminados, devendo a lei ser clara e precisa, de modo a ser compreendida por todos.
LEX DETERMINATA
(LEI DETERMINADA)
A lei deve descrever fatos passíveis de comprovação em juízo e de serem perpetrados.
LEX POPULI
(LEI POPULAR)
A lei deve ser uma lei emanada do parlamento (com representantes eleitos pelo povo).
LEX RATIONABILIS
(LEI RAZOÁVEL)
A lei penal deve ser pautada na razoabilidade.

Reserva legal e legalidade

O princípio da legalidade é, muitas vezes, tratado como sinônimo do princípio da reserva legal. Entretanto, enquanto o primeiro consiste na submissão às leis, o segundo se refere à limitação à forma de regulamentação de determinadas matérias (que, no caso do Direito Penal, é reservada à lei em sentido estrito).

O princípio da legalidade possui previsão no art. 5º, II, da CRFB/88, que dispõe ↴

Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.

Assim, a legalidade é mais ampla que a reserva legal, uma vez que se refere à lei em sentido amplo (todo o qualquer comando emanado do Estado, como leis em sentido estrito, medidas provisórias, decretos, sentenças etc.), enquanto a reserva legal se refere apenas à lei em sentido estrito.

Reserva legal e medida provisória

Quanto à possibilidade de utilização de Medidas Provisórias em matéria penal, há 2 correntes:

1ª CORRENTE É possível, desde que favorável ao réu. É a posição do STF.
2ª CORRENTE Não é possível, uma vez que o art. 62, § 1º, I, b, da CRFB/88 veda a edição de MP sobre matéria relativa à direito penal.

Mandados de criminalização

Mandados de criminalização são ordens emitidas pela Constituição Federal para que o legislador criminalize determinadas condutas. Esses mandados podem ser:

Mandados de criminalização - Princípios do Direito Penal

OFENSIVIDADE OU LESIVIDADE

O referido princípio determina que, para haver crime, deve haver significativa lesão ou perigo de lesão a bem jurídico alheio. Desdobra-se nos seguintes subprincípios:

ALTERIDADE OU TRANSCENDÊNCIA

Desenvolvido por Claus Roxin, esse princípio determina a criminalização apenas de condutas prejudiciais a terceiros.

Assim, a autolesão NÃO pode ser criminalizada, SALVO se houver ofensa a bem jurídico alheio, como no caso da fraude para receber seguro.

Exemplo de aplicação do princípio é o art. 28 da Lei de Drogas, que NÃO pune o consumo de drogas com pena privativa de liberdade, sendo que parte da doutrina não considera que a conduta configure crime.

MATERIALIZAÇÃO OU EXTERIORIZAÇÃO DO FATO

O Estado só pode incriminar condutas humanas voluntárias (fatos/ações), nunca condições internas ou existenciais do agente (nullum crimen sine actio).

Assim, no iter criminis, a cogitação e a preparação são IMPUNÍVEIS. Contudo, quando os atos preparatórios configurarem delito autônomo, eles podem ser punidos. Ex.: associação criminosa (art. 288 do CP).

EXCLUSIVA PROTEÇÃO DE BENS JURÍDICOS

Conteúdo

De acordo com esse princípio, a função do Direito Penal é a proteção de bens jurídicos (interesses sociais relevantes que derivam das garantias constitucionais) insuficientemente protegidos por outros ramos.

Espiritualização de bens jurídicos

Para Claus Roxin, a espiritualização de bens jurídicos é a evolução da proteção do Direito Penal, que passa a abranger não só as situações de perigo concreto, mas também as de perigo abstrato, como os bens jurídicos supraindividuais ou coletivos (meio ambiente, saúde etc.). O STF discorreu nesse sentido no HC 102.087.

PROPORCIONALIDADE

Subprincípios

O princípio da proporcionalidade desdobra-se nos seguintes subprincípios:

Princípio da proporcionalidade

Consequências

A utilização do princípio da proporcionalidade produz as seguintes consequências:

1 Proibição do abuso ou excesso do Estado (garantismo negativo).
2 Proibição da proteção deficiente (garantismo positivo).
3 Análise da necessidade concreta da pena.
4 Análise da suficiência da pena alternativa.

Garantismo integral

O garantismo integral é consequência da proporcionalidade e abrange:

Garantismo penal

Nesse sentido:

O GARANTISMO NEGATIVO É a proibição do excesso (beneficiando o agente).
O GARANTISMO POSITIVO É a proibição da proteção deficiente (beneficiando a sociedade).

Não são admitidos:

O GARANTISMO MONOCULAR Que protege apenas o agente ou apenas a sociedade.
O GARANTISMO HIPERBÓLICO Exagerado.

Espécies

A doutrina aponta, ainda, as seguintes espécies de proporcionalidade:

LEGISLATIVA OU ABSTRATA Destina-se ao legislador, que cria normas gerais e abstratas.
JUDICIAL OU CONCRETA Destina-se ao magistrado, que decide o caso concreto.
EXECUTÓRIA OU ADMINISTRATIVA Destina-se ao executor da norma, no âmbito do cumprimento da pena.

INTERVENÇÃO MÍNIMA

Conteúdo

O Direito Penal deve se limitar a situações de extrema gravidade (o Direito Penal é a ultima ratio).

Divisão

O princípio da intervenção mínima divide-se nos seguintes princípios:

FRAGMENTARIEDADE A ilicitude é fragmentada, de modo que nem todo ilícito é de natureza penal (pode ser civil, tributária etc.). Assim, o legislador deve verificar a necessidade de caracterizar uma conduta como ilícito penal.
  • Projeta-se no plano abstrato (destina-se ao legislador).
SUBSIDIARIEDADE O Direito Penal é aplicável de forma subsidiária, isto é, quando não há outro ramo do direito capaz de lidar com a questão.
  • Projeta-se no plano concreto (destina-se ao aplicador da lei).

Fragmentariedade às avessas

A fragmentariedade às avessas ocorre quando o legislador verifica a desnecessidade de criminalização de determinada conduta. É o caso, por exemplo, do crime de adultério.

NÃO CONFUNDA
A fragmentariedade às avessas NÃO é sinônimo de abolitio criminis, mas causa da abolição do crime. Assim, fragmentariedade às avessas é causa e abolitio criminis é consequência.

INSIGNIFICÂNCIA

Conteúdo

O princípio da insignificância preceitua que o Direito Penal NÃO deve se ocupar de condutas INCAPAZES de causar lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado.

IMPORTANTE
O princípio também pode ser chamado de “bagatela”, se o crime tiver reflexo patrimonial.

Natureza jurídica

O princípio ora estudado possui natureza jurídica de causa supralegal de exclusão de tipicidade. Vale mencionar que, de acordo com o STF, a tipicidade divide-se em:

TIPICIDADE FORMAL Juízo de adequação entre o fato e a norma.
TIPICIDADE MATERIAL  Capacidade de lesão ou perigo de lesão.
TIPICIDADE PENAL = TIPICIDADE FORMAL + TIPICIDADE MATERIAL

Dessa forma, a insignificância exclui a tipicidade material (há a tipicidade formal).

Requisitos

Requisitos objetivos

São condições objetivas para a incidência do princípio:

M Mínima ofensividade da conduta.
A Ausência de periculosidade social da ação.
R Reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento.
I Inexpressividade da lesão jurídica provocada.

MACETE → MARI

Requisitos subjetivos

Os requisitos subjetivos relacionam-se:

ÀS CONDIÇÕES PESSOAIS DO AGENTE A) Reincidente → sobre isso, há duas correntes:
  • 1ª CORRENTE: não se aplica a insignificância (a posição do STF já foi essa).
  • 2ª CORRENTE: aplica-se a insignificância (é a posição do STJ).

B) Criminoso habitual → não se aplica a insignificância (jurisprudência pacífica).

C) Militar → não se aplica a insignificância.

ÀS CONDIÇÕES DA VÍTIMA

A) Extensão do dano (considerando o contexto da vítima).

B) Valor sentimental do bem.

Nesse sentido, o STJ entende que o pequeno valor da res furtiva não se traduz, automaticamente, na insignificância. Há que se conjugar a importância do objeto material para a vítima, levando-se em consideração:

  • A sua condição econômica.
  • O valor sentimental do bem.
  • As circunstâncias e o resultado do crime.

▪ ▪ ▪ tudo de modo a determinar, subjetivamente, se houve relevante lesão.

Aplicabilidade

REGRA O princípio da insignificância é aplicável a todo e qualquer crime.
EXCEÇÕES

Crimes incompatíveis com o princípio.

Ex.: crimes contra a vida, crimes contra a dignidade sexual, crimes contra a administração pública (Súmula 599 do STJ), crimes de violência doméstica e familiar contra a mulher (Súmula 589 do STJ).

Espécies de insignificância

A insignificância da infração pode ser:

PRÓPRIA O fato já nasce sem relevância penal, sendo causa de exclusão da tipicidade material.
IMPRÓPRIA O fato nasce relevante para o Direito Penal, mas, por circunstâncias do caso concreto, verifica-se que a aplicação da pena é desnecessária (ex.: perdão judicial).

Valoração pela autoridade policial

Quanto à possibilidade de valoração da insignificância pela autoridade policial, há duas correntes:

1ª CORRENTE Não é possível, sendo atividade reservada à autoridade judiciária (info. 441 do STJ).
2ª CORRENTE É possível, em razão de sua natureza de exclusão da tipicidade.

Resumindo…

Resumindo os principais pontos do princípio da insignificância, temos o seguinte:

Princípio da insignificância - Mapa mental

PESSOALIDADE OU INTRANSCENDÊNCIA

De acordo com esse princípio – previsto no art. 5º, XLV, da CRFB/88 – nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido.

Assim, a pena é INTRANSFERÍVEL OU PERSONALÍSSIMA, inclusive a pena de multa (enquanto sanção pela prática de crime), que não pode ser descontada da herança.

INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA

Conteúdo

Este princípio – previsto no art. 5º, XLVI, da CRFB/88 – preceitua que as penas devem ser sempre individualizadas, considerando as características da infração penal e do agente que a praticou.

É por esse motivo que se impede a padronização da pena, com a imposição do mesmo regime inicial de cumprimento de pena para todos os indivíduos, desconsiderando as circunstâncias especificas do caso e do infrator. Nesse sentido, o STF entende que os crimes hediondos admitem qualquer regime inicial.

Espécies de pena

A lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:

1 Privação ou restrição da liberdade.
2 Perda de bens.
3 Multa.
4 Prestação social alternativa.
5 Suspensão ou interdição de direitos.

Momentos ou fases

A pena deve ser individualizada nas seguintes oportunidades:

COMINAÇÃO LEGISLATIVA Feita pelo legislador.
APLICAÇÃO DA PENA Feita pelo julgador.
EXECUÇÃO DA PENA Feita pelo juízo da execução criminal.

Resumindo…

Confira o resumo deste princípio no mapa mental a seguir:

Princípio da individualização da pena - MAPA MENTAL

CULPABILIDADE

O princípio da culpabilidade possui diversas vertentes, atuando como:

ELEMENTO INTEGRANTE DO CONCEITO ANALÍTICO DO CRIME De acordo com o conceito analítico, crime é fato típico, ilícito e culpável, sendo a culpabilidade necessária para a sua caracterização.
MEDIDOR OU LIMITADOR DA PENA Uma vez concluído que o fato constitui crime, o magistrado utilizará a culpabilidade para dosar a pena.
ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO A presença do elemento subjetivo do tipo – culpa em sentido amplo (dolo ou culpa em sentido estrito) – caracteriza a conduta, sem a qual não há que se falar em crime. Assim, a responsabilidade penal é sempre subjetiva, NÃO sendo admitida a responsabilidade objetiva.

VEDAÇÃO AO BIS IN IDEM

A vedação ao bis in idem é a proibição da dupla punição pelo mesmo fato. Está previsto no Pacto de São José da Costa Rica, incorporado ao ordenamento jurídico pelo Decreto n. 678/92. Nessa linha:

SÚMULA 241 DO STJ
A reincidência penal não pode ser considerada como circunstância agravante e, simultaneamente, como circunstância judicial.

ADEQUAÇÃO SOCIAL

De acordo com esse princípio, uma conduta não pode ser considerada materialmente típica quando estiver de acordo com as práticas comuns da sociedade. Entretanto, a maioria da doutrina não aceita sua aplicação de forma direta por se contrapor ao princípio da legalidade e, por isso, este princípio teria sua atuação limitada:

1 À fundamentação de algumas abolitio criminis.
2 À ausência de criação de tipos que traduzam condutas com aceitação social e moral.

Acerca disso, veja o esquema a seguir:

Princípio da adequação social - mapa mental

RESUMINDO…

Princípios do Direito Penal

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